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Agente Triplo

 
Eric Rohmer – 2004 – França, Itália, Espanha, Grécia, Rússia

O grande Eric Rohmer faleceu no começo de janeiro. Ele foi um dos principais cineastas da Nouvelle Vague, embora seja dos menos lembrados por nossas distrbuidoras. Salvo engano, dos seus três últimos filmes, apenas A Inglesa e o Duque (2001) estreou no circuito brasileiro (Agente Triplo e o derradeiro Les Amours d’Astree et Celadon só foram exibidos no Festival do Rio). Meu texto sobre o inédito Agente Triplo é minha homenagem tardia ao mestre meu protesto contra sua exibição limitada no Brasil.

Rohmer intercala a narrativa de Agente Triplo com vários cine-jornais – reais – divulgando os fatos políticos mais conturbados da época: 1936 na França. O russo Fiodor (Serge Renko), casado com a grega Arsinoé (Katerina Didaskalu), integra uma organização mundial de aristocratas czaristas, exilados depois da revolução socialista. A vitória da Frente Popular – a esquerda comunista – nas eleições francesas coloca a permanência deles no país em dúvida. Fiodor viaja inúmeras vezes pela Europa, mas Rohmer filma exclusivamente a rotina do casal.

Arsinoé, a verdadeira protagonista do filme, no começo aceita apenas seu marido como fonte de informações confiáveis sobre política. Rohmer estabelece de forma exemplar o papel secundário dela na vida dele na conversa entre o casal e um primo. Preste atenção: enquanto os homens conversam entre si, Rohmer opta por planos fechados deles e só volta a filmá-la quando a conversa acaba.

Em conversas como essa, Fiodor se gaba de saber muito sobre atividades soviéticas e até fascistas na Alemanha e Espanha, sem revelar nada concreto sobre si mesmo (a paranóia do filme é muito eficiente, pois eu suspeitava que qualquer personagem falando com o casal era um espião). Será Fiodor um espião, como o título do filme aparentemente revela? Aos poucos, Arsinoé questiona as idéias e atividades obscuras do marido e o filme se torna uma série de duelos verbais entre eles. A tensão do filme vem da busca dela em descobrir o segredo dele e do nosso conhecimento que a Segunda Guerra logo explodirá.

Nesses duelos, Rohmer estabelece um paralelo sutil entre Fiodor e a função dos cine-jornais presentes em Agente Triplo (nos diálogos mais importantes, ele se mantém distante dela, como uma tela de cinema diante de uma espectadora). Afinal, ambos desempenham o papel de donos da verdade. Talvez porque às vezes eu me sinto impotente quando vejo na TV os novos fatos políticos, fiquei comovido com o irônico desfecho de Agente Triplo. Ele é um apelo para nossa responsabilidade de questionarmos os verdadeiros interesses de nossas fontes de informação, e um alerta para os perigos da confiança cega.

13/02/2010 at 6:24 pm Deixe um comentário


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